abrigo
















debruçada nas paisagens que iam embora
eu observava as pessoas ao meu redor
o cara com o radinho
a moça fazendo sombracelha
o senhor com chapéu e bengala
naquele trem, eu era só mais uma

parecia que alguém havia desligado o meu radinho
aquele que tocava as sirenas, buzinas e xingamentos do trânsito
ali a minha sombracelha dava um semblante tranquilo a minha face
quanto a colocar algo na cabeça, a perseguição cognitiva diária
e a bengala que fazia eu me preocupar com os caminhos que eu ia trilhar
nem estavam lá

aliás a única trilha que eu queria naquele momento era o barulho do trem
aquelas paradas nas estações,
parecia-me por alguns instantes que aquela solidão compartilhada fazia sentido
e aquele silêncio que tanto me dizia

aos poucos meu coração ia adormecendo
há dias ele vivia de insônia
agora ele se debruçou na janela do trem
deitou-se sereno, tranquilo

um rapaz pergunta se pode se sentar ao meu lado
eu nunca tinha visto ele
mas ele tinha os olhos mais brilhantes que eu já vi
como se estivesse deslumbrado com a viagem
acho que foi assim a primeira vez que viajei, mas havia me esquecido

quando cheguei sozinha na estação tomei um café
sentada naqueles banquinhos vermelhos eu me sentia num filme

o sereno, o vento, a chuva
e meu coração calmo, quase dormindo
há tempos eu não parava na estação pra tomar um café

Fui embora com a certeza de que eu precisava parar em algum ponto
que eu precisava de um abrigo
uma casinha tranquila, silenciosa
um repouso cá dentro para entender todo o barulho do lado de fora

3 comentários:

G.C disse...

tou achando seus textos mais líricos ultimamente... mesmo em primeira pessoa, sinto um pouco de distanciamento com as coisas. esse tipo de coisa me agrada, me puxa mais pro texto.

mesmo que o mundo tenha pausas inexatas e inesperadas, a gente tem que ter um tempo pra tomar um café. vislumbro uma tentativa de saída da situação que você criou no texto... senti um alento gostoso do lado de cá.

beijoca.

m disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
* July * disse...

Gostei muito do seu texto... tive a mesma sensação em minha última viagem, só que foi de ônibus e não de trem. Me identifiquei muito. Ainda vou postar a história dessa minha viagem. As vezes precisamos de um silêncio e um momento de reflexão para organizar tudo e entender melhor o que acontece no mundo. Adorei!! Parabéns!

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